sábado, 23 de janeiro de 2010
Vómito
Uma pequena franja de adeptos do futebol é absolutamente incapaz de ver algo mais longínquo á sua frente que a ponta do seu próprio nariz.
São esses adeptos que, secundando dirigentes do mesmo jaez, são capazes de caucionar comportamentos sociais e desportivos como aqueles que as famosas escutas publicadas no YouTube retratam...achando normalíssimo que tal ocorra e não conseguindo ver qualquer ilícito.
Este fenómeno social e comportamental foi magistralmente demonstrado há alguns dias atrás na rubrica Pessoal & Transmissível, da TSF, quando Carlos Vaz Marques entrevistou o investigador universitário Dan Ariely.
As escutas publicadas não são outra coisa que a espuma putrefacta e visível que se forma á superfície desta enorme ETAR a que foi dada o nome de Portugal.
Pior, é um escarro na face de todos os portugueses, a que nenhuma autoridade judicial ousa pôr cobro.
Os actores desta tragicomédia conseguem, pasme-se, que estas provas não sejam admissíveis e, dessa forma, a sociedade, representada pela sua JUSTIÇA, liberta-os, não formaliza culpa e não os leva a julgamento.
O edifício judicial em Portugal ruiu.
Estava em ruínas... e todos o sabíamos.
Não foi preciso que acontecesse aqui o mesmo que em Port-au-Prince para pôr a nú a falta de solidez do edifício legal e a incapacidade de reacção.
Aquilo que se torna óbvio para o cidadão comum não o é para a justiça
Não obstante isso, a justiça não consegue apresentar provas que incriminem estes ou outros cidadãos.
A democracia está doente, muito claramente.
Não escapa ao olhar mais desatento que o cidadão comum não tem defesa possível perante os atropelos e desmandos de que é vítima, enquanto os seus carrascos - indivíduos ou organizações - possuem legalmente todas as garantias de defesa.
A justiça para com todos os cidadãos é um dever do estado democrático que, no entanto, não pode confundir...vitimas com infractores.
E o estado não cumpre o seu dever!
Pouco me importam os nomes envolvidos...
Este espaço não existia no tempo de Vale e Azevedo, como não existia no tempo do Calabote... ou em todos os outros tempos em que os beneficiados e prevaricadores foram outros.
O cidadão comum apercebeu-se, com provas na voz dos intervenientes, da teia de pressões, mentiras, tráfico de influências e deturpação da verdade desportiva que foi erigida.
É inacreditável que a justiça desportiva compreenda o jargão utilizado, puna as acções correspondentes e o direito penal seja incapaz (ou impedido) de chegar a conclusões similares.
Até seria "compreensível", seria até "aceitável" que numa primeira análise os tribunais chegassem a conclusões óbvias ao invés da justiça desportiva, uma vez que esta estaria dominada pela teia habilmente criada ao longo das ultimas três décadas.
Mentira!
As leis que regulam o estado democrático são incapazes de demonstrar a mínima eficácia.
Não é espantoso que tal suceda sabendo-se que há deputados que comemoram esta farsa justamente com o personagem central destas escutas.
Não é segredo para ninguém que a justiça não defende os mais pobres e injustiçados.
Sabe-se que a justiça serve os poderosos e não há coragem de combater os corruptos onde quer que estejam, qualquer que seja a roupa que vistam ou a bandeira que empunhem.
Mais que a justiça é um país que fica envergonhado no meio deste episódio.
Ninguém alguma vez duvidou que o mundo do futebol era o que fica demonstrado.
As escutas publicadas no YouTube são um vómito.
Que haja a coragem de a justiça limpar o vómito colectivo e de tomar as medidas correctivas e prevetivas que evitem mais repetições do escândalo.
Este país que, movimentado pelos mesmos "jornalistas" e pressionado por identicos acessores, apenas tem capacidade para discutir localização de aeroportos, traçado de TGV, traçados de autoestradas e de se unir contra Sócrates vai ter que engolir este elefante.
Da próxima vez que alguém me vier com "conversas da treta" sobre Sócrates vou sarcásticamente inquirir a preferência clubistica e posição perante este caso.
Se encontrarem alibi para este não conseguirão encontrar motivo para condenar aquele.
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